A ansiedade de Cora
Cora (nome fictício) sentia-se muito preocupada, sempre aflita sentindo que algo ruim estava prestes a acontecer consigo ou com sua família. Com o tempo passou a temer também as interações sociais, repreendendo a si mesma após cada contato, entendendo que “poderia” ter falado algo inadequado ou mesmo absurdo. E nesse acúmulo de sofrimento solitário e silencioso, passou a duvidar cada vez mais de si mesma como mulher, como mãe e até como tutora de seus pets, até que um dia encontrou a força necessária para procurar ajuda profissional e foi diagnosticada com transtorno de ansiedade generalizada - TAG.
Com as sessões de terapia, foi gradativamente compreendendo que nem tudo que pensa corresponde à realidade e há pensamentos que são distorcidos. Aprendeu identificar os gatilhos que a faziam sentir-se ansiosa e durante o processo de tratamento foi retomando a confiança em si, nos outros e no mundo.
Luta ou fuga
Há milhares de anos atrás, quando nossos ancestrais habitavam cavernas e a subsistência dependia basicamente da caça, ao se depararem com o perigo a decisão consistia basicamente em lutar ou fugir. Bastava um sinal do cérebro para que sintomas físicos, como boca seca, coração disparado, suor excessivo, tremores, palpitações, respiração curta e ofegante, náuseas e sensação de desmaio fossem sentidas.
Suponha que a reação desta pessoa foi desistir da caça e fugir para abrigar-se em sua caverna e, no entanto, dias após o ocorrido ainda sentia sinais de alerta e intenso mal estar, como se ainda estivesse diante da decisão entre luta ou fuga.
Ansiedade é normal?
A ansiedade é considerada normal quando, por exemplo, prestes a ocorrer uma entrevista de emprego, uma prova, um encontro amoroso, isto é, existe uma causa conhecida e a pessoa consegue controlar as sensações desagradáveis. Entretanto, estar permanentemente em estado de alerta como se algo fosse ocorrer a qualquer momento, ser dominado por pensamentos negativos e sintomas físicos que o fazem acreditar o tempo todo que deve estar preparado para lutar ou fugir é reconhecidamente a ansiedade patológica, necessitando de acompanhamento especializado.
Transtorno de ansiedade generalizada
Conhecida pela sigla TAG, o transtorno de ansiedade generalizada caracteriza-se segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais - DSM-5, por ansiedade e preocupação excessivas em relação a diversas atividades ou eventos que estão presentes na maioria dos dias por pelo menos seis meses.
A pessoa está em permanente inquietação sobre os mais diversos assuntos como família, finanças, trabalho, segurança, relacionamentos.
O diagnóstico é realizado clinicamente e leva em consideração critérios como :
● ansiedade e preocupação excessiva quanto a algumas atividades ou eventos;
● agitação ou sensação de nervosismo ou tensão;
● cansaço;
● dificuldade para concentrar-se;
● inquietação;
● alterações de sono;
● irritabilidade;
● tensão muscular.
Como visto, estamos diante de um transtorno que acomete não apenas o emocional, mas o físico também e acarreta muito sofrimento. Pode surgir em qualquer fase do desenvolvimento, não há idade específica e dados recentes da OMS indicam que há cerca de 264 milhões de pessoas sofrendo com esse transtorno no mundo.
As causas não são totalmente conhecidas, mas há fatores que podem contribuir para seu surgimento, como a genética (filhos de pai ou mãe ansiosos têm grande probabilidade de vir a desenvolver também o transtorno), a química cerebral (um mal funcionamento de células na região do cérebro) e fatores ambientais (situações estressantes, pressão, cobrança, alerta o tempo todo seja no trabalho ou em casa).
A psicoterapia é grande aliada na prevenção e tratamento do TAG, na medida em que a pessoa compreende como e porque ocorre, aprende a identificar a origem dos pensamentos e quais as crenças que sustentam sua ansiedade, assim ela passa a corrigi-las e ter maior controle sobre si. Pode ser necessário, conforme a situação, além da psicoterapia o acompanhamento psiquiátrico e medicação.
Se você identificou-se com Cora e com tudo que leu até o momento, se tais sintomas e preocupações já fazem parte de sua realidade há mais de seis meses, não hesite, busque ajuda profissional.
Obrigada por acompanhar o Jornal do Juvevê e a coluna de Psicologia Vida Plena Psi, até a próxima.
Cláudia Ducci Hartmann
Psicóloga CRP 08/37672
@psi.claudiaducci
Revisão ortográfica
Mauricio Ducci Hartmann
Referência
Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-5 / [American Psychiatric Association ; tradução: Maria Inês Corrêa Nascimento ... et al.] ; revisão técnica: Aristides Volpato Cordioli ... [et al.]. – 5. ed. – Porto Alegre: Artmed, 2014.
Monteiro Campos, L. A., Amorim, G. M. ., Lopes, J. de S. M., & da Silva, J. C. T. (2021). ANSIEDADE SOCIAL: O QUE A BOCA NÃO FALA O CORPO SENTE. RECIMA21 - Revista Científica Multidisciplinar - ISSN 2675-6218, 2(3), 183–197. https://doi.org/10.47820/recima21.v2i3.159de
A ansiedade é deveras um sentimento perfeitamente normal. Devemos, no entanto, estar alerta quanto ao descontrolo de sensações e reações descontroladas, e sempre com a consciencia de que pedir ajuda é o primeiro passo para o alivio do desconforto provocado pela ansiedade excessiva. Ótimo artigo. Parabéns.
Cora é o exemplo claro das tendências a sentir os sintomas por inúmeros seres humanos principalmente nos tempos atuais em que as responsabilidades familiares e de muitos profissionais que atuam nas mais diversas atividades e que estão expostos a criar sentimentos psicológicos severos de TAC.
Excelente conteúdo. Hoje as pessoas estão assim o mundo precisa de ajuda.
E o tratamento é acompanhamento psicologico e medicação se necessario. Parabéns Dra Claudia pelo seu conteúdo esclarecedor